17/02/2014

Decididamente, não somos Christopher McCandless

De volta ao Brasil, depois de duas semanas viajando, é hora de escrever o que deu certo e o que não deu na viagem pela América Latina com muito pouco dinheiro.

O objetivo era viajar sem grana, se virar, comer pouco, ganhar alguns trocados com a música e dormir onde der. Uns 700 reais para viver os 15 dias, contando transporte e tudo mais, percorrendo o Peru, Bolívia e Argentina.

Tínhamos uma bagagem pesada com tudo que precisávamos para sobreviver, barraca, saco de dormir, roupas quentes, arroz, miojo e sopa. Na mente, tudo era possível, se Christopher McCandless conseguiu viver anos comendo apenas arroz e pegando carona pelas estradas então porque o Soy-nomada não conseguiria por 15 dias?

A realidade mostrou que as coisas são diferentes, ou que somos diferentes. O fato é que não conseguimos fazer a viagem apenas com o dinheiro que levamos. Por sorte conseguimos comprar algumas passagens pela internet e pegamos uns dolares emprestado, assim conseguimos dormir em alguns hostels, comer comida e pegar Onibus ao invés de esperar uma boa alma nos dar carona.

Mas porque? Porque queríamos ir com pouco dinheiro e porque não conseguimos?

Fazem umas 3 semanas que voltamos da viagem e tenho me perguntado isso todos os dias. A primeira resposta é mais simples. Levamos pouco dinheiro porque não tínhamos mais, não estávamos dispostos a gastar muito com a viagem. Também, penso que viajar com dinheiro 'sobrando' nos enquadra como turistas clássicos e isso não é bom. Nos livrar da dependência do dinheiro, mesmo que por um período curto de tempo, também é nos livrar da dependência de um sistema que nos oprime e pressiona diariamente.

Seguindo os ideais do Chris (Alexander Supertramp) achamos que poderíamos viajar com a Liberdade Total, sem rumo, sem contas, porém com um destino, a volta. A Liberdade Total, máxima liberdade possível, dentro de uma sociedade, cobra seu preço e ele foi alto para nós. Nascemos e crescemos em cidades e em uma sociedade do consumo. Nós não plantamos para comer, trabalhamos para isso.

Comer arroz mal cozido, racionar água, dormir mal ou somente dormir quando possível, tudo isso por um grande período de tempo nos fez cambalear. Doenças como desarranjo, febre entre outras nos derrubaram de vez.

Não saber quando voltar para casa, como fazer pra voltar, depender da 'luz divina' para retornar, realmente abala o lado psicológico e afeta o físico já debilitado. Acredito que o que nos difere decisivamente de Chris é que temos raízes em algum lugar, vamos com o pensamento de retornar, necessitamos retornar para sermos realmente felizes.
Quando não se tem certeza de nada, a necessidade de retornar é uma coisa que te pressiona e te derruba, mas também pode fazer você sobreviver.

Acredito, pelas experiências vividas, para complementar a frase de Amyr Klink "Um homem precisa viajar ... " eu diria que: "Um homem precisa viajar, precisa retornar e precisa continuar sonhando com novas viagens para ir ainda mais longe e continuar voltando...."

Da mesma forma que pensar em voltar nos faz feliz, pensar em viajar nos faz viver.

Até a próxima aventura do Soy-Nomada

Um comentário:

Caroline disse...

Acompanhei as postagens e, por experiência própria, acredito que elas e até as fotos não representam 1% do que vocês efetivamente viveram... Essa postagem me fez lembrar de um trecho simbólico para mim (que o seja, de alguma maneira, para vocês):

"A natureza se realiza em movimento e também nós, seus filhos, que somos o que somos e ao mesmo tempo somos o que fazemos para mudar o que somos. Como dizia Paulo Freire, o educador que morreu aprendendo: "Somos andando". A verdade está na viagem, não no porto. Não há mais verdade do que a busca da verdade. Estamos condenados ao crime? Bem sabemos que os bichos humanos andamos muito dedicados a devorar o próximo e a devastar o planeta, mas também sabemos que não estaríamos aqui se nossos remotos avós do paleolítico não tivessem sabido adaptar-se à natureza, da qual faziam parte, e não tivessem sido capazes de compartilhar o que colhiam e caçavam. Viva onde viva, viva como viva, viva quando viva, cada pessoa contém muitas pessoas possíveis e é o sistema de poder, que nada tem de eterno, que a cada dia convida para entrar em cena nossos habitantes mais safados, enquanto impede que os outros cresçam e os proíbe de aparecer. Embora estejamos malfeitos, ainda não estamos terminados; e é a aventura de mudar e de mudarmos que faz com que valha a pena esta piscadela que somos na história do universo, este fugaz calorzinho entre dois gelos".
(Trecho do livro De Pernas pro ar - A escola do mundo ao avesso, de Eduardo Galeano).

Parabéns pela viagem e que venham outras.